Análise | Death Stranding 2: On the Beach - "The First Time Was So Nice, I Had To Do It Twice"



Hideo Kojima… eu nem sei por onde começar. Há quatro anos escrevíamos a análise de Death Stranding: Director’s Cut, a versão definitiva de um jogo que, na altura, dividiu opiniões mas acabou por se tornar uma experiência inesquecível para muitos, eu inclusive. Na altura escrevi: “Death Stranding não é somente uma grande obra-prima, é uma experiência única e com uma história envolvente digna de um filme. Porém o seu gameplay deixou-nos em diversas ocasiões de nariz torcido pelo quão repetitivo o jogo se pode tornar.” Tinha receio que esta sequela caísse nos mesmos erros. Tinha medo de me voltar a aborrecer ou de sentir que estava apenas a repetir o que já vivi. Mas não foi isso que aconteceu. Aliás, parece que o Kojima leu a nossa análise, porque tudo aquilo que critiquei na altura… ele melhorou. Para mais pormenores recomendo-vos a ler a nossa análise de Death Stranding: Director’s Cut.

A nossa nova jornada começa onze meses após os eventos do primeiro título. Sam Bridges, agora longe da UCA, vive isolado no México com a pequena Lou, tentando proteger-se, e protegê-la, de tudo o que representa o seu passado. No entanto, a paz não dura muito. Um dia, uma velha conhecida, Fragile, aparece. Já não faz parte da Fragile Express, a companhia que outrora liderava a reconstrução da América, mas sim de uma nova organização: a Drawnbridge. Esta nova estrutura é composta por caras familiares e tem como objetivo expandir a rede quiral para outras partes do globo. Para isso, Fragile pede a Sam que volte a calçar as botas de estafeta e conecte o México à rede. Essa missão, aparentemente simples, acaba por levá-lo a algo muito maior. Descobrimos rapidamente que, através de um portal, é possível viajar até à Austrália, um novo território completamente desligado, cheio de perigos, mas também cheio de vida. É nesse novo continente que se desenrola grande parte da aventura.


Se o primeiro jogo nos apresentava uma América cinzenta, desolada e quase sem esperança, a Austrália entrega-nos um mundo mais vivo, mais imprevisível e com mais história por contar. Há zonas florestais densas, áreas de pesca abandonadas, minas subterrâneas, regiões cobertas de neve e até locais devastados por desastres naturais. O ambiente não é apenas um pano de fundo bonito, é parte da experiência, isto por estes mencionados desastres naturais que, muitas vezes, ocorrem durante a nossa deslocação. É ele que dita o nosso ritmo, que nos obriga a pensar nas rotas, que nos desafia constantemente. E, mais importante, é ele que nos faz sentir vivos, mesmo quando caminhamos sozinhos. Isto em adição à presença de animais vivos, algo que não havia no primeiro jogo e que foi um grande acréscimo. 

Mas não é só o mundo que mudou: as personagens também. Sam continua a ser o coração da história, mais maduro, mais silencioso, mas com um peso emocional visível. Lou, o bebé que carregávamos numa cápsula no primeiro jogo, agora cresce e assume um papel mais importante. Já não é apenas uma presença passiva: reage, observa, interage, e acima de tudo, influencia decisões. Fragile, por outro lado, revela-se uma verdadeira líder. Mais confiante, mais determinada, mostra que a reconstrução do mundo já não depende só de Sam, mas sim do trabalho de equipa de todos os que desejam o mesmo fim. Existe também um propósito por trás de toda a história principal, a origem de Lou e isso faz com que esta jornada de Sam deixe de ser somente uma missão, mas sim um objetivo para alcançar um bem maior. Tem um propósito.



Também voltamos a ver Deadman e Heartman, cada um com os seus próprios caminhos, mas ligados à missão de expandir a rede quiral. Os diálogos entre estas figuras são mais ricos e emocionais, com mais partilhas pessoais, mais dúvidas existenciais e, acima de tudo, mais humanidade. A relação entre todos eles evoluiu. Já não são apenas colaboradores: são sobreviventes com um passado partilhado, e isso nota-se. O tempo passou e a forma como se tratam também. Há mais respeito, mais cuidado nas palavras e uma constante sensação de que perderam muito… mas sem nunca desistirem.

Para além das caras conhecidas, são apresentadas ainda novas como Tarman, Rainy, Tomorrow, Dollman, entre outras. Estas que, apesar de terem a sua estreia neste jogo, têm um enorme impacto na narrativa, tanto pelas suas interações com Sam, assim com pelo seu papel próprio no enredo, uma vez que todas têm um passado e o seu papel ao longo da aventura - uma delas até se torna num companheiro de viagem e pode ser utilizado até como equipamento de arremesso a fim de localizar os inimigos num ponto de vista mais aéreo (algo semelhante ao falcão de Assassin's Creed).


Ao nível de jogabilidade, a estrutura base mantém-se, como seria de esperar. Continuamos a transportar cargas de um ponto a outro, a atravessar montanhas, rios e terrenos traiçoeiros. No entanto, desta vez tudo está mais refinado, mais variado, mais dinâmico. Temos novas ferramentas que mudam completamente a forma como abordamos o terreno: luvas de escalada, drones de apoio, robôs que nos acompanham, equipamento para suportar climas extremos e  novos veículos mais adaptados ao ambiente australiano. 

Assim como foi mencionado na análise do jogo anterior, a carga deve ser equipada em Sam no inicio de cada missão, algo que influencia bastante a nossa viagem uma vez que a forma como gerimos as mercadorias pode ser um ponto crucial para o seu sucesso. Por outro lado, devemos ter sempre connosco todo o equipamento básico para a mesma, desde escadas, apoios de escalada, sacos de sangue, entre outros. Estes últimos têm como função regenerar os nossos níveis de sangue caso soframos dano. Para além disto existe ainda a possibilidade de beber água, que aumenta a nossa stamina, comer certos insetos que nos aumentam certos atributos e apanhar cristais que servem como combustível para alguns equipamentos. Vale salientar que todo o vestuário também deve ser estudado, desde a camuflagem do nosso fato, o calçado e até algum acessório essencial como os exo-esqueletos que nos ajudam a carregar mais cargas.



Apesar disso, as missões estão melhores que antes. Já não temos somente missões lineares e básicas que constavam em entregar X carga no tal local vezes e vezes sem conta. Agora as missões têm justificação para serem feitas, fazem sentido e não são copia aqui, cola aqui. Muitas das missões têm como objetivo destruir bases inimigas, recuperar cargas perdidas, eliminar um grupo de BTs ou até mesmo capturar algum animal e entregá-lo são e salvo.

À semelhança do que acontecia no primeiro jogo, sempre que entregamos estas cargas, recebemos pontos de experiência que são repartidos diretamente em diferentes categorias de acordo com os procedimentos que efetuamos ao longo da missão. Para além disso, recebemos ainda melhorias de equipamento, armas e até novos equipamentos e armas, contudo, algumas delas somente desbloqueamos ao fazer missões secundárias, funcionando como um incentivo à sua realização. Por outro lado, se fizermos as entregas através de fast-travel (como vou mencionar de seguida) não recebemos qualquer xp e a pontuação dessa entrega será de DHV Magellan, esta que por sua vez é a mais baixa pois nao requer dificuldade alguma. Para além desta possibilidade já conhecida, agora surgiu também a possibilidade de se fazer upgrades através da típica arvore de habilidades. Para tal devemos utilizar pontos "APAS" que são adquiridos através da realização de missões.



E uma das novidades mais práticas: a possibilidade de planear a rota com detalhe antes de iniciar uma missão. Isto permite-nos escolher o trajeto mais seguro ou mais rápido, consoante o tipo de carga ou os perigos esperados. Essa fase de preparação, que já existia de forma básica no primeiro título, ganha aqui uma nova profundidade que dá ainda mais prazer a quem gosta de estratégia e antecipação. Outro aspeto que reparei e gostei bastante foi a qualidade de polimento do mundo. Ao contrário do que acontecia no primeiro jogo, neste consegui efetuar a maior parte das entregas com um veículo, algo que nos seria impossível no título anterior devido à quantidade de obstáculos que encontrávamos no caminho.

Outra novidade é a possibilidade de acrescentar atributos aos nossos veículos como armas ou até mesmo uma pinça que apanha cargas perdidas de forma automática, algo bastante útil para receber aqueles pontos de xp extra. Os menus também receberam alterações e agora estão bastante melhorados, tendo-se tornado apelativos e práticos de se usar.



Continuamos a encontrar estruturas construídas por outros jogadores, assim como sinais para interagirmos com os mesmos, algo que já tinhamos no título anterior e manteve-se pois foi um dos aspetos mais únicos do jogo. Toda esta possibilidade de criar, de forma indireta e nada planeada, uma comunidade de jogadores que se ajudam entre si foi algo bastante único e que até aos dias de hoje ainda não vi igual. Ou seja, vamos continuar a encontrar e a poder construir, estruturas como: torres de vigia, pontes, geradores, catapultas de carga e estradas. Para complementar conseguimos encontrar e reconstruir ainda termas, com que podemos interagir (algo semelhante ao Ghost of Tsushima) e monocarril, este bastante útil para transportar cargas até diferentes pontos sem esforço algum.

Os já mencionados desastres naturais são também uma adição à experiência que a meu ver, trouxe imersão à aventura, não fazendo somente as cutscenes parte da campanha mas também o trajeto todo que fazemos ao longo das mais variadas missões. Para além das já conhecidas chuvas do tempo que degradavam toda a carga em que tocavam, temos também terramotos, a subida do nível da água e até chuvas de meteoritos. Fora os desastres naturais, podemos contar também com localizações repletas de neve, ventos fortes, localizações de altas altitudes e desertos, o que demonstra a enorme diversidade que este novo país nos entrega.


Como foi referido anteriormente, outro dos grandes destaques é a DHV Magellan, a nave mãe, que serve também como base e nos acompanha em algumas secções. Esta pode ser estacionada ao lado de quase todos os postos que temos ao longo do mapa, o que ajuda tanto em "fast travel" como em transporte de mercadorias, pois através dela conseguimos chegar aos locais de forma mais segura. É mais um aspeto de complexidade que contribui para um ritmo mais variado, menos monótono. Ainda durante as nossas caminhadas, podemos utilizar o apoio da nave para disparar misseis na direção que pretendemos, auxiliando-nos assim em confrontos com muitos inimigos. Dentro desta existe também um quarto privado que serve como refúgio para descansar, gerir material, mudar a aparência visual de Sam (em termos de roupa) e testar as armas no campo de tiro. Para além disso, temos também diversas opções de interação com as restantes personagens. 

Quanto ao combate, é impossível ignorar a sua evolução. No primeiro jogo era quase um extra, aqui é uma parte significativa da jogabilidade. Há mais armas, desde lança-granadas a armas furtivas e até opções corpo a corpo mais eficazes. A possibilidade de fazer stealth está mais facilitada e com a possibilidade de deixar a mochila ou até mesmo somente a carga de entrega no chão e seguir sem ela, esta abordagem de jogabilidade é mais bem sucedida do que no titulo anterior.



Há novos inimigos, incluindo grupos organizados com diferentes padrões de comportamento, robôs meca que contém diversos tipo de dimensões e até batalhas mais complexas contra os conhecidos BTs (ou em português Eps) as já conhecidas criaturas invisíveis que representam os mortos presos entre o mundo dos vivos e o outro lado. Estes BTs continuam a ser um dos elementos mais misteriosos e assustadores da série. Sempre que somos apanhados por estes, somos puxados para uma espécie de mundo alternativo, onde enfrentamos formas grotescas e gigantescas destes seres num verdadeiro cenário de terror apocalíptico. Apesar de ainda existirem, senti que reduziram bastante a sua quantidade no mapa. Enquanto jogava o primeiro jogo, senti que não conseguia percorrer 200 metros sem encontrar um grupo destas criaturas, contudo, já neste isso não aconteceu. 

Agora é possível disparar enquanto se conduz, derrotar tanto BTs como os diferentes inimigos em stealth, reconhecer o mapa e saber onde estão os inimigos antes mesmo de entrar no local de combate e podem dizer adeus às armas de fogo. Sim, para quem jogou ao Death Stranding original, lembram-se que não podiam matar pessoas pois isso causava o aumento do número de BTs ao longo do mapa? Pois bem, isso já não é um problema pois as armas de fogo real foram praticamente substituidas por armas tranquilizantes que não causam a morte.


Apesar de tudo isto, há algo que continua igual: a solidão. Percorremos quilómetros e quilómetros "sozinhos", somente nós, a nossa bebé e o Dollman. Mas é uma solidão diferente. Não estamos sozinhos como antes. Estamos sozinhos com propósito e isso muda tudo. Foi uma noção que me deu alento e motivação ao longo das minhas mais de 40 horas de jogo, algo que não senti no primeiro título.

O jogo continua a apostar imenso na imersão. O DualSense vibra e responde ao terreno, sentimos as pedras, a água, o peso da mochila. A banda sonora volta a estar ao mais alto nível, com momentos musicais inesperados que nos fazem parar, olhar em volta e simplesmente existir naquele mundo. O som ambiente, mais uma vez, tem um papel fundamental. Não há música constante. O silêncio fala. E quando a música aparece, normalmente da Low Roar ou outras bandas, é porque algo importante está a acontecer.


Graficamente, é uma evolução clara. Cenários mais detalhados, melhor uso da luz natural mesmo sem ray-tracing, reflexos realistas e expressões faciais que nos dizem tudo sem necessidade de diálogo. O desempenho é sólido, com tempos de carregamento quase inexistentes e bugs praticamente imperceptíveis. Mesmo em zonas densas ou em momentos mais intensos, o jogo mantém-se fluído e acreditem, existem muitas áreas densas e gigantes.

Conclusões

Death Stranding 2: On the Beach é muito mais do que uma sequela. É uma resposta. É um “eu ouvi-vos” por parte de Kojima. Refinou aquilo que já era único, acrescentou conteúdo com peso, e trouxe mais emoção a cada decisão. Não é um jogo para todos, tal como o primeiro também não era. É lento, introspectivo, simbólico. Porém, quem embarcar nesta viagem, vai encontrar uma experiência ainda mais forte, mais madura e mais pessoal do que a anterior.

Não é só sobre ligar o mundo. É sobre manter essas ligações. É sobre o que fazemos com elas quando o silêncio volta.
E, Kojima… sim. Eu sei que leste mesmo a nossa análise.


O melhor:

  • Narrativa mais intima e emocional;
  • Ambientação soberba;
  • Melhorias gráficas;
  • Um grande salto em relação ao primeiro título;
  • Melhorias no combate.


Nota do GameForces: 10/10


Título: Death Stranding 2: On the Beach
Desenvolvedora: Kojma Productions
Editora: Sony Interactive Entertainment
Ano: 2025

Nota: Esta análise foi realizada com base na versão digital do jogo para a PlayStation 5, através de um código gentilmente cedido pela editora.

Autor da Análise: Carlos Cabrita


Análise | Death Stranding 2: On the Beach - "The First Time Was So Nice, I Had To Do It Twice" Análise | Death Stranding 2: On the Beach - "The First Time Was So Nice, I Had To Do It Twice" Reviewed by Carlos Cabrita on agosto 01, 2025 Rating: 5

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