
O ano de 2025 não foi apenas uma loucura absoluta no que toca a lançamentos de jogos com orçamentos que fazem os nossos olhos transformarem-se em cifrões - ou lá como se chama o símbolo do euro -, ou sob a alçada de grandes editoras multinacionais. Não, este ano foi uma loucura quase tão grande no que diz respeito a lançamentos de pequenas produtoras independentes. Sim, 2025 voltou a ser um ano onde o mercado independente voltou a mostrar toda a sua arte, todo o seu engenho e toda a sua criatividade, oferecendo imensos jogos fenomenais.
E mesmo num ano completamente insano como este, muitos elementos da nossa equipa fizeram questão de pôr de parte os grandes títulos que estavam na berra para envergar pela sempre surpreendente oferta de títulos indie. Ainda que isso tenha resultado em backlogs mais gordos, acreditem que não nos arrependemos dessa decisão. Vale sempre a pena louvar, aclamar e celebrar todos os que trabalham para nos trazer obras de arte. Por isso, celebremos agora os melhores jogos indie que jogámos este ano!

Dispatch destacou-se, para mim, como o melhor indie do ano porque faz algo que poucos jogos independentes conseguem: criar uma experiência intensa e focada, onde cada minuto conta e nada parece supérfluo. Ainda que não dependendo de grandes cenários nem de mecânicas elaboradas, esta experiência recorre à força da sua atmosfera, da forma como a tensão cresce lentamente e de como cada escolha transmite a sensação de que algo está em risco. É minimalista na superfície, mas profundamente eficaz.
O que realmente eleva Dispatch é a maneira como utiliza a narrativa interativa. Cada conversa, cada decisão e cada silêncio são tratados com a importância certa, criando uma ligação imediata entre o jogador e as pessoas que estão do outro lado da linha. As histórias que vão surgindo parecem reais, cruas, por vezes desconfortáveis, e isso dá ao jogo um peso emocional que muitos títulos maiores não conseguem alcançar. Não é apenas resolver uma situação tensa ou ser um herói; é lidar com a humanidade das pessoas envolvidas. O jogo obriga-nos a ouvir, interpretar e reagir, num ritmo que nunca soa artificial.
Ao mesmo tempo, Dispatch mostra aquilo que torna o indie tão especial: a coragem de apostar numa ideia simples, mas levá-la até às últimas consequências. Não tenta ser tudo ao mesmo tempo, não tenta competir com produções gigantes, concentrando-se naquilo que faz bem e aperfeiçoa cada elemento à volta disso. A direção de som é impecável, a escrita é contida mas eficaz, e o ambiente é tão envolvente que se torna difícil largar o jogo antes de saber como tudo termina. É uma experiência curta, mas marcante, capaz de ficar na memória muito depois de os créditos surgirem.
Por isso, acredito que de entre os diversos indies de qualidade do ano, Dispatch destaca-se com naturalidade. Não por ser grandioso, mas por ser certeiro. É um jogo que prova que a força de uma boa ideia, bem executada, continua a ser um dos maiores trunfos do desenvolvimento independente.

Filipe Mesquita - Hollow Knight Silksong
Surpresa, surpresa! Um dos fanáticos residentes de Hollow Knight escolhe o novíssimo Silksong para indie do ano! Certamente não jogou outros grandes indies deste ano, como Dispatch, Hades II ou até *usar tom fantasmagórico* o controverso *fim do tom fantasmagórico* Clair Obscur: Expedition 33!
Sabem o que tenho a dizer em relação a isso? Têm toda a razão, ainda não tive oportunidade de chegar a essas, certamente, fantásticas experiências. Mas, e peço que se acalmem com esse vaiar todo, Hollow Knight: Silksong é mais do que merecedor de todo o louvor que eu lhe possa dar.
Silksong pega na extraordinária base do original e oferece uma aventura em tudo maior e melhor. Mais inimigos e bosses com lore interessantíssima, mais segredos incrivelmente bem escondidos num mundo maior e mais prazeroso de explorar. E uma jogabilidade ampliada, mais diversa e mais desafiante do que antes. E mais não me vou alongar, porque é bem provável que venha a falar mais sobre Silksong… num artigo mais à frente!

Quando penso em indie de qualidade, Clair Obscur: Expedition 33 surge logo na cabeça — e, honestamente, este prémio podia muito bem ter ido para ele também. Mas Clair Obscur, apesar de indie na origem, já anda a nadar com os big sharks e quase que pertence ao mar dos títulos mainstream.
É por isso que, este ano, sinto que o Indie do Ano tem de ser Split Fiction. O jogo pega numa fórmula cooperativa que já conhecemos — aquela jogabilidade a dois em ecrã dividido que obriga à coordenação e comunicação constante — e leva‑a a lugares inesperados, contando-nos uma historia que vai alternando sem aviso entre mundos de ficção científica e fantasia, com desafios tão variados que, por vezes, sentimos que estamos a jogar dois jogos num só.
Em Split Fiction, não é só passar aquele nível: é saltar de um universo com hoverboards, gravidade alterada e batalhas improváveis para outro cheio de trolls e dragões, sempre em parceria com um amigo ou familiar, seja localmente ou em crossplay.
O jogo acerta na mouche nesta categoria porque abraça a sua identidade indie de forma plena — não tenta ser tudo para todos, mas sim uma experiência cooperativa única e criativa, com mecânicas e momentos que fazem sentido a dois, onde cada desafio é uma desculpa para comunicar, rir e, muitas vezes, perder a paciência (no bom sentido).
Split Fiction lembra‑nos que os melhores jogos indie não são apenas sobre tamanho ou orçamento, mas sobre como conseguem surpreender, divertir e neste caso em especifico, conectar duas pessoas num mesmo ecrã de forma memorável.

Carlos Cabrita - Dispatch
Tal como referi na minha análise, entrei em Dispatch à espera de encontrar apenas mais um jogo de narrativa interativa, claramente inspirado na fórmula popularizada pela Telltale Games. As expectativas eram moderadas. Ainda assim, estaria a mentir se dissesse que a temática de super-heróis não me despertou curiosidade suficiente para lhe dar uma oportunidade.
O resultado final superou largamente qualquer previsão. Dispatch entrega uma história excecional, surpreendentemente bem escrita, acompanhada por um desenvolvimento de personagens cuidado, consistente e emocionalmente envolvente. Cada episódio acrescenta novas camadas ao enredo, mantendo o interesse constante e evitando a sensação de repetição tão comum neste tipo de jogos.
O maior mérito do jogo está na forma como constrói a sua aventura: com ritmo, intenção e identidade própria. Não se limita a imitar fórmulas já conhecidas, mas consegue elevá-las, criando uma experiência que prende e que deixa vontade de continuar. É um daqueles casos raros em que, quando termina, ficamos a desejar que a história se prolongue por mais uma temporada, ou duas, ou três.
Dispatch é a prova de que o espaço indie continua a ser um dos mais criativos e arriscados da indústria. Pela sua ambição narrativa, qualidade de escrita e impacto emocional, é, sem dúvidas, a minha escolha para Melhor Indie do Ano.

Tiago Sá - Hollow Knight Silksong
Pessoal, vou fingir por uns segundinhos que me importo com a polémica em torno de Clair Obscur: Expedition 33 e do seu rótulo de indie. Oh sim, deveras inadmissível, um projeto de tamanha envergadura e investimento externo ser considerado independente! Pronto; com esta indignação em nada histérica, finalmente arranjei um espacinho onde enfiar Hollow Knight: Silksong.
Por vários anos consecutivos, Silksong era de longe o meu jogo mais antecipado. E provavelmente o teu, e o teu, e o teu… A qualidade de Hollow Knight falava por si mesma e em inúmeras frentes, a ponto de pessoas diferentes esperarem diferentes caminhos para Silksong. Por isso, quando esta sequência se-nos apresenta após uma espera incomportável, uma questão pede resposta: poderia Silksong estar à altura das expectativas?
Para mim, não. Por esta não esperavam, né? A minha jornada ao controlo de Hornet apresentou uma série de divergências em relação à de Knight que apontam quase unanimemente contra a imersão, liberdade e surpresa que sentira no primeiro Hollow Knight. E quando removemos várias das condições que elevaram o predecessor aos meus olhos, o que sobra em Silksong? Um jogo sublime!
O reino de Pharloom é colossal e recheado de surpresas, inimigos e bosses - superando largamente a oferta de conteúdo do predecessor. Hornet enquanto personagem jogável é graciosamente ágil e dá azo a combates ainda mais alucinantes e com um nível de dificuldade mais estimulante do que os disputados pela Vessel de outros tempos. O worldbuilding é veiculado com a mesma naturalidade e sobriedade que haviam tornado a história de Hallownest tão empolgante de se decifrar, e o mundo volta a ser povoado com todo o tipo de NPCs memoráveis - incluindo a própria Hornet que, ao expressar-se em diálogos simultaneamente elegantes, acutilantes e firmes, é um genuíno prazer de ler e acompanhar. A banda sonora troca a melancolia lúgubre do território moribundo do Pale King pela tímida esperança que ainda resiste sob a Citadel, sem abdicar da majestade e memorabilidade.
Silksong pode não me ter proporcionado a exata experiência que ambicionava após Hollow Knight mas, em todos os bullet points que possamos formular, não há dúvidas: Silksong afirma-se resolutamente como um Hollow Knight maior e melhor.
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Introdução por Filipe Castro Mesquita
Edição do Texto por Tiago Sá
Thumbnail e Imagens de Texto por Carlos Cabrita
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