Análise | Dispatch - Qualquer um pode ser um Super-Herói


Depois de termos mergulhado nos primeiros quatro episódios de Dispatch, finalmente vimos o desfecho desta incrível narrativa e percebemos de imediato o quão ambiciosa a AdHoc Studio tornou esta experiência. O que inicialmente parecia apenas promissor revelou-se uma aventura muito mais intensa e emocional, para mim, é claramente um forte candidato a jogo do ano. O que antes parecia uma promessa divertida de gestão e escolhas, agora mostra profundidade, emoção e consequências reais. Cada novo episódio não só amplia a história, mas também nos faz sentir o peso das nossas decisões, o impacto das relações com a Z‑Team e até a força do romance e da vingança que moldam o destino do protagonista. É a conclusão da proto-análise, mas também a confirmação de que Dispatch não é apenas uma comédia de super-heróis, é uma experiência onde cada escolha conta, cada personagem importa e cada momento tem peso.

A jogabilidade mantém-se fiel ao que já conhecíamos: não existe um mundo aberto ou semi aberto para investigarmos, pelo que os únicos momentos de interação (à excepção das escolhas) são os quick-time events nas partes de ação (estes que podem ser desativados), os momentos de gestão de equipa nos quais temos de decidir quais membros da nossa equipa irão resolver os crimes que surgem ao longo do período laboral e minijogos de hacking em momentos de ação (estes que vão se tornando cada vez mais complexos). 


As escolhas continuam a ser inúmeras, mas agora percebemos que o jogo lhes dá um peso muito mais inteligente. Aqueles momentos que antes tratávamos quase como secundários (um comentário casual, uma decisão aparentemente inofensiva, uma resposta menos pensada) acabam por moldar relações, desbloquear reações inesperadas e até alterar a forma como certas cenas se desenrolam. Não estamos a falar apenas de grandes ramos narrativos, mas de pequenas ondulações que tornam o mundo mais coerente e a jornada mais pessoal. Sentimos, episódio após episódio, que o jogo está constantemente a “tomar notas” sobre quem fomos até ali e queremos ser daquele momento em diante.

A gestão da Z-Team também acompanha essa evolução. No início parece apenas um extra simpático, mas rapidamente se transforma num sistema que exige atenção: escolher o herói certo para cada situação deixa de ser uma questão de “stats” e passa a envolver personalidade, historial e até o estado emocional da equipa. Cada episódio acrescenta novos desafios, limita recursos, aumenta a pressão e, mesmo assim, nunca nos pune com um game over. O jogo entrega uma enorme liberdade pois podemos ignorar este sistema e avançar apenas pela narrativa, mas se o fizermos vamos sentir isso mais tarde nas conversas, nas atitudes e até na forma como os heróis nos respondem. Dispatch recompensa o envolvimento sem castigar o desinteresse, mas deixa muito claro que o mundo reage ao nosso desempenho, quer o queiramos ou não.


Narrativamente, Dispatch dá um salto claro. Aquilo que parecia apenas uma promessa na primeira metade transforma-se numa história muito mais ambiciosa que respira melhor, arrisca mais e aposta fortemente nas relações humanas. A vertente romântica do protagonista (que inicialmente parecia um detalhe) torna-se um dos pilares emocionais da reta final, cruzando-se de forma intensa com o verdadeiro motor da história, a sua necessidade de vingança tornam-se no combo perfeito para um enredo que nos leva a tomar um caminho baseado nas nossas emoções, influenciando decisões, alimentando conflitos e acrescentando camadas de vulnerabilidade a uma personagem que até então conhecíamos sobretudo pelo sarcasmo e frieza.

Ao mesmo tempo, todas as outras personagens crescem connosco. A dinâmica do grupo deixa de ser um conjunto de interações engraçadas e passa a mostrar lealdades frágeis, mágoas antigas, reconciliações improváveis e momentos de choque. O desenrolar da narrativa torna isso claro: há diálogos que cortam nos magoam e têm impacto, há silêncios desconfortáveis e há confrontos que nos deixam a roer as unhas. O jogo força-nos a olhar para cada membro da equipa não só como ferramentas para missões, mas como pessoas com desejos, limitações e feridas.


Sentimos que não estamos só a assistir a grandes revelações e acontecimentos, estamos a ser puxados para conflitos que mexem connosco de forma quase física. Frustração, fúria, alegria inesperada, tristeza honesta… Dispatch obriga-nos a sentir tudo. A certa altura, percebemos que já não estamos a gerir apenas um grupo de ex-vilões, estamos a decidir o futuro das pessoas que acompanhámos durante horas. A história atinge uma escala que nunca adivinharíamos nos primeiros episódios, e é precisamente isso que torna esta segunda metade tão marcante.

Porém nem tudo é perfeito e assim como a parte da gestão de equipa é completamente "ignorável" o que traz alguma liberdade a quem não achar muita graça a essa vertente mais tática, isso faz com que esta mesma mecânica perca algum peso sobre a sua presença no jogo, que, por sua vez, é o ponto de distinção dos restantes jogos do género, perdendo de certa forma a sua identidade. Outro fator que sentimos foi o facto dos episódios serem um pouco curtos em termos de narrativa. Em episódios com uma duração média entre 40 minutos a 1 hora (mais coisa, menos coisa), cerca de 20 minutos ou mais são nesse modo, o que se torna, em alguns momentos repetitivo e que quebra um bocado o climax do enredo.

Em termos técnicos, Dispatch mantém-se consistente do início ao fim. A performance é estável, sem quebras ou falhas que perturbem o ritmo, e as transições entre cenas funcionam sem problemas. O som continua a ser um dos pontos mais fortes. Dobragens sólidas, bem dirigidas e responsáveis por grande parte do peso emocional e acompanhadas por uma banda sonora discreta, usada apenas quando realmente "faz falta". Não há grandes mudanças ao longo dos episódios, mas a qualidade mantém-se sempre fiel e isso é exatamente o que permite que a narrativa tenha o impacto que pretende.


Conclusão

No final, Dispatch não é apenas um jogo de narrativa, ou mais um jogo de super-heróis, é uma experiência que nos agarra, que nos desafia e nos faz sentir cada escolha como se fosse nossa. A AdHoc Studio transformou um conceito promissor (e bastante popular no mundo das séries) numa narrativa intensa onde a vingança, o romance e as relações humanas se entrelaçam com gestão estratégica e momentos de pura emoção. Em Dispatch cada personagem importa, cada decisão tem consequências, e cada cena envolve-nos de forma profunda. Mesmo com alguns episódios curtos e a vertente de gestão ser "pseudo" opcional, o mundo de Dispatch reage a cada passo que damos, mantendo-nos no limite entre tensão, humor e emoção. É mais do que uma história de super-heróis, é uma experiência memorável, ousada e poderia perfeitamente ser candidata a jogo do ano. É uma obra que não nos esqueceremos e que deixará a certeza de que cada minuto jogado valeu a pena.


O melhor

  • Narrativa evolvente com escolhas significativas;
  • Performance estável e áudio excelente;
  • A mistura perfeita entre humor, romance e vingança;
  • Um modo de gestão de equipa bem conseguido, porém...


O pior

  • ... com um aspeto um pouco opcional e que quebram, por vezes, o desenrolar da narrativa;
  • Curta duração de alguns episódios.

Nota do GameForces: 10/10


Título: Dispatch
Desenvolvedora: Adhoc Studio, Inc
Editora: Adhoc Studio, Inc
Ano: 2025


Autor da Análise: Carlos Cabrita


Análise | Dispatch - Qualquer um pode ser um Super-Herói Análise | Dispatch - Qualquer um pode ser um Super-Herói Reviewed by Carlos Cabrita on novembro 21, 2025 Rating: 5

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